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Por: Renato Miracca – Sócio Fundador do Guruvet

Sou veterinário desde 1987 e convivo com os colegas de Portugal há cerca de 7 anos. Por conta disso e da crise econômica brasileira, é muito comum colegas do Brasil me perguntarem sobre o mercado português e vice-versa. Então resolvi compartilhar minha visão neste post sobre a experiência que adquiri nestes dois mercados que possuem muita coisa em comum, além do idioma.

Para começar, vou mostrar alguns números:

Portugal Brasil Proporção Brasil/Portugal
População 10 milhões 215 milhões 21 vezes
Renda per capta US$ 21mil 9,8mil 0,46 vezes
Pets (cães, gatos, aves e outros) 6,7 milhões 120 milhões 17 vezes
Veterinários 5.800 157.000 27 vezes
Cursos de Medicina Veterinária 6 380 63 vezes

Valores aproximados obtidos nos conselhos profissionais e associações do mercado Pet.

Ao analisar os dados acima, existe certa proporção entre população, número de pets e veterinários nos dois países, mas devemos lembrar que a distribuição de renda no Brasil é muito diferente da existente em Portugal, o que significa que a maior parte da população brasileira ainda não dispõe de recursos para oferecer um bom atendimento aos seus animais. Por outro lado, o que chama a atenção é o número de cursos de medicina veterinária que no Brasil é 63 vezes maior, inclusive estima-se que 50% dos cursos de veterinária do mundo estejam no país. Isso tem causado um crescimento exponencial nos últimos anos. Por exemplo, quando me formei recebi a inscrição no CRMV-SP nº 5.197 (estado de São Paulo) e atualmente esta na casa dos 35.000, ou seja, em 30 anos, somente no estado de São Paulo, foram formados mais de 30.000 veterinários!

Em Portugal existe um movimento para se impedir aberturas de novas faculdades de veterinária, pois a média de veterinários por habitante já é 80% maior do que em outros países mais ricos da U.E. como Alemanha e Reino Unido. Já no Brasil a briga é para evitar abertura de cursos à distância. Pasmem! No Brasil a criação de novos cursos é atribuição do MEC (Ministério da Educação e Cultura) e não existe qualquer preocupação na demanda do mercado, mas apenas no preenchimento de requisitos técnicos burocráticos. Já em Portugal, a OMV (Ordem dos médicos Veterinários) tem voz mais ativa perante os órgãos governamentais, além de existirem mais regras para controlar o excesso de vagas por parte do próprio mercado Comum Europeu, visto que o diploma passa a valer para toda a União Europeia. Por conta disso é cada vez maior o número de formados que sai do país em busca de melhores oportunidades e salários em países como Alemanha e Reino Unido.

Algumas semelhanças entre os dois mercados:

-O médico veterinário se sente desvalorizado pela sociedade e acha que sua remuneração é inferior ao que seria correto.

-A gestão das empresas é um desafio para os veterinários. Eles tentam delegar a função para outras pessoas como recepcionistas, gerentes, etc.

-A inclusão dos veterinários “millennials” no mercado tem sido desafiadora nos dois mercados.

-O governo esta apertando o cerco para evitar a evasão fiscal. Existe um controle cada vez maior sobre as notas fiscais e tudo esta se tornando informatizado.

-Os centros veterinários se preocupam mais na aquisição de novos clientes do que na fidelização dos já existentes.

-Ainda existe um grande espaço para melhoria e profissionalização dos Centros Veterinários.

Peculiaridades de cada país:

-Em Portugal o fenômeno da especialização ainda esta começando ao passo que no Brasil já tem, ao menos, uma década.

-Em Portugal a profissão de enfermeiro veterinário já é reconhecida e regulamentada, enquanto no Brasil o veterinário ainda é o “faz-tudo” na maior parte das clínicas, ou então tem que preparar uma pessoa para lhe ajudar.

-O acesso a equipamentos e mobiliário de qualidade em Portugal é mais fácil e barato, por isso as clínicas são muito bem montadas. No Brasil os custos dos equipamentos, principalmente se forem importados, é alto por conta dos impostos incidentes.

-O sistema tributário brasileiro é extremamente complexo, com vários impostos: ICMS, ISS, IR, PIS, COFINS, etc., o que causa grande dificuldade de entendimento e a necessidade de fazer muito planejamento tributário por parte das empresas. Já em Portugal existem basicamente dois impostos: o IVA (com valores diferentes para produtos e serviços) e o IRC (imposto de renda).

-Por pertencer à União Europeia, Portugal é mais ligado aos centros acadêmicos europeus enquanto o Brasil possui afinidade com os EUA, por isso o intercâmbio acadêmico entre os dois países ainda não é muito intenso. Mas este quadro vem mudando nos últimos anos, pois por conta da qualidade de vida em Portugal, semelhanças culturais, a “não” barreira da língua, o desenvolvimento social e econômico, o acesso à tecnologia de ponta europeia e principalmente devido à crise politica e econômica no Brasil, muitos colegas veterinários brasileiros já começaram a se desbravar em terras portuguesas.

Portugal e Brasil possuem muitos pontos em comum, começando pelo idioma, relação histórica e por tantos laços familiares existentes, afinal qual brasileiro que não possui um ancestral português e qual português que não possui um primo ou tio no Brasil? Por isso, acredito que os dois mercados irão se aproximar cada vez mais nos próximos anos, tanto no intercambio de profissionais quanto no compartilhamento de conhecimento.

Vejo oportunidades de trabalho muito interessantes para os colegas brasileiros, principalmente aqueles com experiência em internação, pois os grandes hospitais de Portugal necessitam este tipo de funcionário (atenção, neste caso é necessário a validação do diploma)  e também uma grande oportunidade para colegas portugueses se aprimorarem em clínicas de especialidades no Brasil. Esta sinergia me parece muito benéfica para a evolução e profissionalização da Medicina Veterinária nos dois países.

Esta é a minha visão… Abraços e boa semana!